Classificar doenças mentais é uma difícil tarefa

por Edson Toledo

Como é o meu debut nesta coluna, pensei que seria oportuno fazer uma breve discussão sobre a necessidade de classificar os transtornos mentais antes de escrever sobre as doenças da alma, como se costuma dizer ao se referir à psicologia e psiquiatria, já que esta coluna aborda temas relacionados a estas especialidades.

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Sendo a psiquiatria uma das especialidades da medicina, ela ainda nos dias de hoje se esforça para obter uma classificação válida e útil na sua atuação prática com diagnósticos confiáveis dos transtornos mentais.

A etiologia, que é o estudo sobre a causa/origem de uma doença, quando aplicada à psiquiatria não possui o privilégio de ter a maioria dos seus quadros mentais suficientemente elucidados diferentemente de outras especialidades médicas que ordenam as causas/origem das doenças em genético-hereditárias, vascular, infecciosas, neoplásicas e autoimunes. Fato esse que contribui para que reformulações das classificações sejam de tempo em tempo propostas.

Assim, toda vez que se faz uma reformulação do sistema de classificação, os especialistas quase sempre as critica, com observações sobre os limites e os efeitos nocivos dessas novas classificações. Nem mesmo a mais conhecida das classificações, o DSM, sigla em inglês do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais, que está na sua quinta versão, está livre de tais críticas e comentários.

Esse fato se deve porque a classificação dos transtornos psiquiátricos constitui, como se costuma dizer, o "calcanhar de Aquiles" dessa empreitada, pois um de seus papéis é conferir credibilidade científica às definições da doença mental e legitimar a prática clínica da psiquiatria com a pesquisa científica.

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Um fator a considerar é o de que informações advindas dos recentes avanços científicos de áreas como: neurociências, genética e neurofisiologia tornaram algumas das questões básicas da psiquiatria e a sua classificação muito mais complexa.

Como exemplo, podemos citar o temor de que a neurociência clínica possa substituir, eventualmente, a psicopatologia no diagnóstico dos transtornos mentais ou mesmo de que as experiências subjetivas que afetaram os pacientes psiquiátricos percam a sua influência diante dos achados advindos desses avanços científicos.

Porem, uma coisa é certa, são inegáveis os ganhos que trouxeram os atuais sistemas de classificações. Entretanto, alguns "efeitos colaterais" advindos de um sistema que está em constante mudança são aparentes, já que os critérios classificatórios ainda sofrem por vez com a falta de coerência teórica e também estão passiveis de influências de forças mercadológicas, ideológicas e políticas.

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Outro aspecto a considerar é o de que as falhas no desenho desse sistema de classificação limitam a sua utilidade e permitem interpretações errôneas ou mau uso dos seus critérios pelos menos hábeis. Mas uma coisa é certa, utilizar-se dos sistemas atuais de classificação sempre traz alguma estabilidade à prática quando se pretende fazer um diagnóstico psiquiátrico, seja na clínica ou na pesquisa.