Isolamento excessivo, privação sensorial extrema e tédio

por Regina Wielenska

Humanos e vários outros animais guardam entre si notáveis semelhanças comportamentais e hoje quero falar sobre a importância de se cultivar uma vida rica em variedade de estimulação externa.

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Não é à toa que zoológicos bem gerenciados empregam especialistas em comportamento animal, dedicados a criar formas de enriquecimento ambiental para os animais sob seus cuidados. Um ambiente variado, permeado por novidades e desafios, pode ser capaz de prevenir o surgimento de alguns comportamentos estereotipados, autolesivos e agressivos dos animais.

Leões podem, por exemplo, receber nacos de carne amarrados a cordas em locais que exijam deles empenho ao “caçarem” sua ração diária. Cordas, escadas, plataformas, caixas, panos e outros objetos são incorporados ao recinto de primatas. Desse modo eles podem se entreter e dispor de atividades de “recreação”, num ambiente que, se desprovido de tais recursos, serviria para um reduzido número de possibilidades. Há primatas que começam, experimentalmente, a operar tablets para fazer desenhos e ver vídeos e os resultados são muito interessantes.

Nos programas de TV da Super Nanny, com a educadora Jo Frost, várias vezes testemunhei crianças destruindo coisas, subindo literalmente nas paredes, trocando agressões desmedidas com os irmãos. Uma das causas frequentes disso é a falta de oportunidade para brincadeiras de fato interessantes, estruturadas e supervisionadas por um adulto capaz de se divertir com a atividade e de transmitir esse entusiasmo às crianças.

Os pais, por vezes assoberbados de obrigações e problemas, acostumaram suas crianças a ficarem passivas frente a um brinquedo eletrônico ou a assistirem televisão como forma de ficarem isentos da necessidade de interagirem com elas. Desastre na certa.

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Num documentário sobre resiliência, termo emprestado da Física e Engenharia pela Psicologia para se referir à capacidade de um material de se recuperar após um impacto, vi o depoimento de presos políticos. Eles narraram que ao serem mantidos sob intenso confinamento criaram um jeito parecido com um código morse para se comunicarem por meio de pancadas nas paredes entre as celas. E assim chegavam até a darem aulas de idiomas e outras disciplinas uns aos outros. O conteúdo era menos relevante do que o diálogo, a possibilidade de se ter algo a fazer na solitária, interagindo com um semelhante.

As UTIs (unidades médicas que recebem pacientes pós-cirúrgicos ou que exigem cuidados muito especiais) se modernizaram e hoje oferecem aos pacientes a chance de se receber visitas, ouvir música, ter alternância entre claro e escuro, visitas dos Doutores da Alegria, entre outras oportunidades. Trata-se de uma estratégia que colabora, em muito, para a prevenção de sintomas depressivos e psicóticos que acometiam pacientes graves, confinados ao asséptico e patologizante ambiente estéril da UTI.

Precisamos de mais exemplos ou esses bastam?

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Animais, incluindo os humanos, se beneficiam de algo interessante ou estimulante para fazer, o que pode ser uma hora de meditação ou relaxamento, escrever uma coluna de internet (o meu caso!), tecer a colcha do enxoval de uma neta, plantar vegetais, levar o cachorro para passear, deixar a cozinha cheirosa e brilhante, compor uma sinfonia ou um sambinha descompromissado. Escolha sua lista pessoal e dedique-se a ela, curta o fruto de suas ações, exercer ativamente suas competências resultará em concreto benefício para sua saúde e bem-estar. Experimente.