A criança tímida: timidez não é patologia

por Ceres Araujo

A pessoa tímida tende a experimentar desconforto na interação com pessoas e com situações sociais em geral.

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Seu comportamento mostra-se menos espontâneo, até inibido, o que pode comprometer as trocas intelectuais e afetivas com os outros, podendo gerar perdas na qualidade de vida, na medida em que o retraimento se torna muito intenso.

A pessoa tímida costuma preocupar-se excessivamente com o julgamento dos outros a respeito de si mesma, o que a faz manter-se cautelosa, buscando antecipar as consequências de suas ações, para planejar condutas adequadas às exigências do ambiente.

Timidez não é patologia e não deve ser confundida com antipatia, personalidade antissocial ou fobia social. A timidez, no caso de crianças, não deve ser confundida com medo ou covardia.

Não nascemos tímidos

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O bebê nasce pronto para os intercâmbios sociais, mas isso não significa que ele seja, necessariamente, um ser apto para uma conduta social adequada às demandas da sociedade e da cultura na qual ela nasceu. Sabe-se, hoje, que o cérebro e a mente do bebê irão se desenvolver em função da interação com os outros seres da mesma espécie. A qualidade dessa interação será determinante para o desenvolvimento psíquico. A criança será ensinada progressivamente a fazer trocas afetivas e, dessa maneira, conseguirá se relacionar com os outros e com os grupos, nos quais se insere. Aprenderá as regras extrínsecas que regem a conduta social e saberá modular seu comportamento frente à percepção da reação que sua ação causa na outra pessoa.

No processo do aprendizado da conduta interativa e social, a criança pode se mostrar mais tímida ou mais impulsiva. Muitos são os fatores responsáveis por uma forma ou outra de atitude: dotação genética, personalidade dos pais, posição da criança no sistema familiar, métodos educacionais, aos quais a criança foi exposta etc.. A criança pode conseguir sozinha controlar de forma mais adequada seus impulsos, regular melhor suas emoções, ao se sentir cada vez mais segura nos seus movimentos de afirmação no mundo e consequentemente deixar de ser tímida ou impulsiva demais.

Diferente da criança impulsiva, a criança tímida é observadora e, muitas vezes, cautelosa, por estabelecer relações de causa-efeito entre os eventos e por antecipar as consequências de suas ações e das eventuais ações das outras pessoas. É uma criança que pensa muito, que vive mais no mundo das ideias, das suposições e das crenças e que vive menos no mundo da experiência concreta. Tende a ter mais facilidade para se adaptar a um funcionamento imaginário, que para se adaptar à realidade objetiva. Pode ser uma sonhadora, uma pessoa que se entretém com suas fantasias e seus planos e que pode, por outro lado, não ter tanta facilidade com as relações interpessoais, com as situações imprevisíveis, com o novo.

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Um filho tímido tende a ser fonte de preocupação para seus pais que associam timidez à insegurança. Não necessariamente uma criança tímida é insegura. O que ocorre é que, com frequência, esses pais foram também crianças tímidas, adolescentes tímidos e depois adultos tímidos e não desejam que seus filhos também o sejam. É muito difícil isso não acontecer, pois o modelo transmitido é o da timidez.

Existem pais que foram crianças tímidas, que se lembram do esforço que fizeram para superar a timidez e que não querem que seus filhos percam oportunidades que a vida está sempre oferecendo. Esse risco é real, pois a pessoa tímida pode acabar sendo mais um espectador dos acontecimentos que o sujeito de sua ação.

Assim, ainda que timidez não seja patologia, um excesso de timidez pode ocasionar atrasos, descompassos e perdas na adaptação às situações, podendo acarretar vivências de frustrações. Arrepender-se do que não se teve coragem de fazer é muito pior do que se arrepender do que se fez. A timidez pode ir aumentando e se tornar patológica, trazendo impedimentos para a adaptação à vida.

O filho tímido merece consideração e não cobranças. Ele não deve ser atropelado" com exigências para ações rápidas. Deve ser respeitado quanto ao seu tempo e incentivado quanto às suas competências. Reforços positivos e não negativos farão dele alguém corajoso e sábio. É necessário que os pais tímidos ou que foram tímidos controlem suas ansiedades e seus temores, para que não contaminem seus filhos com expectativas ruins. Pelo contrário, precisam valorizá-los para que eles se sintam com coragem e segurança para serem, de fato, os protagonistas da sua história de vida.