Senhas na era digital: um bem ou um mal?

por Ivelise Fortim – psicóloga componente do NPPI

Digite sua senha! Quem já não leu esta frase, que cada vez mais faz parte do cotidiano das pessoas que possuem qualquer tipo de conta em banco? O recurso que deveria facilitar esse tipo de acesso, muitas vezes, pode se transformar em um problema: é necessário que se decore muitas senhas para realizar, às vezes, uma única operação no caixa eletrônico.

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Por exemplo, dependendo do banco do qual se é cliente, para uma simples retirada de dinheiro em um caixa eletrônico, é necessário digitar três, ou às vezes quatro senhas. A maioria dos bancos pede uma senha numérica, depois disso outra composta de letras, ou códigos de um cartão, e/ou a data do nascimento. Como nenhuma tecnologia é à prova de quebras dessas formas de segurança, cada vez mais se acrescentam novas senhas para uma mesma operação. A justificativa dos bancos para esses procedimentos é a aplicação de mecanismos de proteção que visam proteger nosso “patrimônio”.

Entretanto, para o usuário, existem as consequências desses processos. Para pessoas sem muita formação escolar, com dificuldades intelectuais ou ainda para muitos idosos, o caixa eletrônico se transforma em um grande problema, ou mesmo em uma máquina inutilizável. Muitas pessoas não conseguem decorar ou entender os procedimentos, dada a quantidade de senhas pedidas pelos equipamentos.

É muito comum nos deparamos com idosos que não conseguem efetuar o que é pedido: erram as senhas, erram os botões, digitam senhas em lugares errados. Atentos a isso, muitos bancos colocam funcionários jovens para ficarem postados ao lado das máquinas, como auxiliares daqueles correntistas que têm mais dificuldades nesses procedimentos.

E a confusão de senhas? Quem possui contas em bancos diferentes, padece. Sempre existe a chance de se digitar a senha da sua conta do outro banco. Afinal, essa senha era a de quatro dígitos ou a de seis? Qual era mesmo a letra correspondente a este cartão?

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Senhas na internet

Quando se trata de Internet, a quantidade de senhas exigidas aumenta: Senhas para o ‘login’, senhas numéricas de quatro, seis ou mais dígitos, frases secretas, códigos de letras, códigos impressões em cartões, assinaturas eletrônicas – tudo para evitar cada vez mais a ação dos hackers, que por sua vez complexificam seus golpes proporcionalmente à criação desses recursos de segurança.

E como ficam os usuários dos bancos ‘on-line’ ? Muitos criam diferentes mecanismos para lidar com a situação. Em alguns bancos as senhas são impostas, em outros, escolhidas pelo usuário. Quando é possível escolher, muitos optam por senhas que remetem a coisas pessoais como nomes de seus familiares, datas de nascimento, datas importantes de pessoas queridas. Muitas pessoas acabam utilizando a mesma senha para várias funções.

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Apesar de ser norma de segurança não usar a mesma senha em locais diferentes, e nem usar datas possíveis de se encontrar em documentos, muitas pessoas acabam se valendo desse recurso. Além disso, com a grande restrição das normas de segurança, fica cada vez mais difícil criar uma nova senha: não pode haver números sequenciais, repetidos; em algumas senhas, requere-se que haja letras e números misturados. Outro mecanismo que contraria as normas de segurança é deixar as senhas escritas em algum lugar. (Quem nunca guardou uma anotada em um papelzinho pequenino dentro da carteira, ou na agendinha de telefone…?)

Apesar do desrespeito às normas de segurança de senhas, torna-se cada vez mais difícil decorar a grande quantidade de senhas que são exigidas. Se a pessoa tiver conta em dois bancos, por exemplo, pode ter que decorar até oito senhas diferentes, se quiser usar o internet ‘banking’.

A vida moderna exige cada vez mais da capacidade de memorizar que o ser humano possui. Para muitas pessoas, isso se torna apenas mais uma exigência da vida cotidiana; para outras, a tarefa de ir ao banco retirar o salário acaba virando um transtorno. Mesmo para os mais versados em informática, a memória pode confundir e trazer problemas de outro tipo. Ao se digitar a senha errada por três vezes, o sistema bloqueia o nosso acesso, e, muitas vezes, torna-se necessário comparecer a agência para o desbloqueio da conta. Em uma cidade grande como São Paulo, isso significa a perda de pelo menos meia hora do dia, ou mais.

E a “facilidade” de se desbloquear por telefone? Vamos lá: digite número da agência, número da conta, senha numérica de quatro dígitos, senha numérica de seis dígitos, mais dois dígitos para desbloquear o cartão, e mais três para desbloquear senha e….. Você errou a senha! Nesse caso, deverá retornar ao menu principal, para recomeçar tudo de novo! Então você opta por digitar ‘9’, desesperado, para falar com a atendente, que por sua vez poderá te transferir para outros atendentes – por pelo menos duas vezes -, sem resolver seu problema. Muitos ficam nervosos, reclamam, e descontam nos operadores, que, às vezes, nem são vinculados ao banco em questão, pois em boa parte esses serviços são terceirizados.

É inegável que esses artefatos digitais geraram facilidades. O surgimento do internet ‘banking’ fez com que se reduzisse em muito as filas nos bancos presenciais; é possível consultar o saldo, pagar contas, fazer transferências de valores sem sair de casa. Os caixas eletrônicos possibilitam que a retirada de dinheiro e outras operações nas contas, em qualquer lugar do país; o atendimento por telefone permite que o correntista resolva questões junto aos bancos dentro de um carro, em pleno horário de rush.

Entretanto, os caixas eletrônicos, internet ‘banking’ e atendimento por telefone, criados para facilitar, cada vez mais se burocratizam exigem maior competência dos seus usuários. Cada vez mais é exigido que o usuário domine informática, tenha boa capacidade de memória, e destreza nos teclados – do caixa eletrônico, do telefone, do computador.

Por enquanto, nossa tecnologia de segurança se configura nas senhas. Será que está próximo aquele futuro prometido pelos filmes de ficção científica ? Poderemos realmente contar com sistemas de segurança baseados na leitura de impressões digitais, e de retinas? Será que nossa vida será realmente facilitada com a chegada desse tipo de recurso? Ou surgirão novos complicadores para a sua utilização?