Hipnose ao seu alcance

por Roberto Goldkorn

Quando era bem pequena minha filha mais velha tinha crises de choro compulsivo toda noite. Comecei a perceber que era mais ou menos no mesmo horário e só depois de muito chorar ela sossegava e dormia como um anjinho.

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Naquela época estava lendo muita coisa sobre hipnose, que já praticava de forma amadora há alguns anos.

Desconfiei que esse choro era uma irritação por não saber ainda desligar o modo-vigília para entrar no modo sono, talvez pelo excesso de estímulos que lhe proporcionávamos.

Uma noite resolvi usar um dos métodos de pré-hipnose descrita pelo Dr. Lamartine de Holanda em seu livro Cibernética dos Estados Emocionais. Nesse livro ele desmistifica a hipnose e a coloca na categoria (ampla diga-se de passagem) das alterações dos estados emocionais. Ele diz que existem dois princípios básicos (conceituais) da hipnoterapia: o materno positivo e o paterno negativo.

O “estilo” materno é aquele em que a mãe consola o filho fazendo carícias suaves, modulando a voz para aliviar alguma dor ou tensão de seu filho. O paterno é mais incisivo, autoritário e usa gestos fortes, tom de voz elevado, carregado de autoridade.

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Como minha filha estava naquele choro, que é quase um transe, pois não se comunica e não ouve nada do que lhe era dito, optei pelo modo paterno (que aliás é muito a minha cara). Uma noite em pleno transe de choro compulsivo, eu a peguei pelos ombros delicados colei seu corpo com rispidez no berço e comandei: DORME AGORA!

Embora eu esperasse um resultado positivo, o que aconteceu me surpreendeu: ela dormiu instantaneamente e em alguns segundos nem o suspiro pós-choro havia mais. Ela dormia como um “anjo”, suave e com aquele sutil sorriso de paz nos lábios.

Essa historinha familiar tem um objetivo: mostrar que a hipnose em seus muitos variados graus está presente no nosso dia a dia muito mais do que seria confortável admitir.

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Mães e pais fazem hipnose sem saber, e o mais preocupante é que a sociedade como um todo, exerce uma influência hipnótica sobre nós, tirando-nos uma lasca de nossa vontade própria, se é que isso existe.

A hipnose mesmo quando é suave como a carícia de uma mãe, cria laços entre os agentes, uma ponte por onde estímulos podem passar para ambos os lados e com consequências a longo prazo.

Assim o hipnotizador de ontem, será o hipnotizado de hoje e vice-versa. Essas interações são fundamentais para se entender as mudanças de estados emocionais tanto de filhos como de pais.

Observo com preocupação as inversões de papéis que acontecem entre pais e filhos uns assumindo o papel do outro, gerando muito desconforto, mas que à luz do conhecimento da hipnose moderna, pode ser explicado.

Filhos podem aprender mais no nível subconsciente (emocional) do que intelectualmente (racional) com essa interação hipnótica com seus pais. Como a maioria de nós vive mais no nível emocional-espontâneo do que no consciente, e esse nível costuma ser muito baixo, primitivo até, não espanta que venhamos a hipnotizar nossos filhos num padrão primitivo, quase selvagem.

Se a sociedade deixar de exercer seu papel regulador-repressor, sem que os pais evoluam e se tornem hipnotizadores de mais alto nível, então estaremos em apuros, como de fato já estamos.

Filhos que recebem cargas avassaladoras de estímulos maternos, acolhedores e tranquilizadores podem se tornar adultos mimados, frágeis no trato com as agruras da vida e com baixa capacidade de lidar com as frustrações. Isso porque está implícito nas mensagens subliminares (ou pós-hipnóticas) da “mãe” acolhedora, que não importa o que aconteça -, ela ali estará para satisfazer as necessidades dele.

Por outro lado se preponderarem às hipnoses paternas, autoritárias, um indivíduo enquadrado, obediente, servil ao grande pai (o estado) incapaz de exercer seu crivo crítico pode emergir como aconteceu na Alemanha nazista e está acontecendo, por exemplo, na Coreia do Norte.

Deixar de exercer influência hipnótica, ou de ser influenciado por ela, é impossível. Mas podemos buscar um equilíbrio consciente nessas relações. Identificar quando estamos sendo “hipnotizados” (repetição, modulação da voz, alteração da voz para “ganhar no grito”, uso de gestos teatrais que acompanham comandos verbais hipnóticos são alguns sinais.

Nem sempre recusar esses estímulos é positivo, só quando percebermos que estamos sendo “torcidos” numa direção contrária à nossa natureza. Mesmo assim às vezes torcer um criminoso violento contra a sua natureza selvagem pode ser bom para todos, inclusive para ele.

Podemos usar a hipnose digamos “natural” (sem o aprimoramento da técnica) de muitas formas positivas para melhorar a relação entre as pessoas. Observo muitos pais e até namorados fazerem isso, sem saber que estão usando algum nível de hipnose; provocam com estímulos paternos/agressivos uma reação de contra-ataque ou de defesa, para em seguida desmontar ambas as reações com estímulos maternos suaves e acolhedores. A repetição desses comportamentos pode manter o outro oscilando emocionalmente e vir a se tornar no futuro um ser instável e inseguro.

Quando se fala tanto sobre o poder da palavra, das repetições, mantras e cia, está se falando de auto-hipnose. Mas tanto a auto-hipnose quanto a hipnose propriamente dita só funcionam, segundo os maiores especialistas, se caminharem paralelas ou assimilarem a natureza íntima do indivíduo. Embora os ocultistas e orientalistas discordem, essa seria uma explicação do por que as técnicas de autoconvencimento (auto-hipnose) funcionam para alguns e falham para outros.

Mas minhas pesquisas mostram que se trata muito mais de alinhar formas do que conteúdos. Ou seja, qualquer sujeito pode ser convencido através da hipnose (ou auto-hipnose) a fazer inclusive aquilo que contraria a sua mais profunda natureza, desde que se encontre a FORMA, o veículo, as palavras certas. É como encontrar a senha certa para abrir um determinado arquivo ou cofre.

O conhecimento das inesgotáveis possibilidades da hipnose pode nos ajudar a lidar com muitas situações do nosso cotidiano, e até nos proteger de “hipnotizadores” amadores que estão por aí cruzando as nossas vidas. Dos nossos pais aos patrões, colegas de trabalhos, namorados e cônjuges, todos estamos querendo exercer nossos poderes hipnóticos sobre todos.

Inclusive eu – agora você que está lendo isso… vai se sentir sonolento… ficar cada vez mais relaxado… sentir as pálpebras pesadas e… rir muito!