Mudanças e crises nos levam a modificar nossa estrutura de proteção

por Antônio Carlos Amador

A família constitui para o ser humano o principal grupo social de pertinência. A organização familiar é *primária e universal, resultando que no seu interior se estabelecem relações pessoais intensas e recíprocas que vão conferir a seus membros uma consciência de identidade, tanto individual como grupal.

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Nós atravessamos, ao largo de nossa existência, uma série de crises inevitáveis e até mesmo desejáveis. Crises que nos levam a mudar, que podemos inclusive viver como um drama, mas que resultam necessárias porque nos ajudam a crescer.

Os chineses, com sua milenar sabedoria, atribuem ao termo "crise" o duplo significado de "perigo" e "oportunidade". Também para os gregos enquanto que o termo original para crise não tem só o significado de desestabilização, mas também de crescimento e de "um passo adiante".

Nesta perspectiva, podemos também olhar o universo da família onde encontraremos essas crises. Algumas pessoais, causadas pelo desenvolvimento insatisfatório dos sonhos da juventude, pela tomada de consciência de nossas próprias limitações ou simplesmente pelo envelhecimento. E outras crises de desenvolvimento que são universais e por isso são previsíveis: mudanças estruturais no ciclo da vida, crises de identidade, outras como a crise do casamento, enfraquecido pela rotina do cotidiano, pela perda de romantismo entre o casal, a infidelidade, o esfriamento da sexualidade na vida adulta, o divórcio. Ou ainda a aceitação da sexualidade do(a) filho(a) adolescente, a ruptura das expectativas de sucesso profissional, o envelhecimento e assim por diante.

Nesses períodos de crise o sistema familiar se desestabiliza, surgindo a necessidade de mudanças profundas, uma vez que os valores, metas, expectativas e papéis são afetados. Reavivam-se os conflitos passados, constatando-se que a insatisfação, a angústia e a hostilidade podem ser muito elevadas e criar sérias dificuldades, principalmente em função da tentativa de bloquear a crise. Seria mais adequado nos adaptarmos a ela, aceitando a perda para a qual há que assumir novas tarefas e papéis.

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Tudo o que nos acontece – formaturas, casamento, filhos, divórcio, um emprego conseguido ou perdido – nos afeta. Tais acontecimentos são os fatos concretos de nossas vidas. O impacto de uma crise sofre também a influência do significado que o meio lhe dá. A infidelidade, por exemplo, é uma crise familiar que tende a ser percebida socialmente como um drama; enquanto que as crises de reencontro do casal são vistas mais positivamente.

A cada mudança de um estágio de desenvolvimento para outro temos que modificar nossa estrutura de proteção. Ficamos expostos e vulneráveis, mas também ativos novamente, capazes de nos olharmos e compreendermos de modo antes ignorado. Essas mudanças podem durar alguns anos, mas ao superarmos cada uma delas, iniciamos um período mais prolongado e estável no qual temos uma sensação de reconquista do equilíbrio.

Muitas vezes nós vivemos as crises como sendo algo que só acontece conosco e acabamos infelizes nos abandonando na solidão. Não percebermos que conhecer suas características facilita um enfrentamento, deixando-as menos dramáticas. Especialmente nas crises de desenvolvimento, um bom princípio de solução pode ser partilhar a vivência e as preocupações com outras pessoas, contar o problema e escutar suas sugestões ou então buscar ajuda especializada.

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* Que precede outro em lugar ou em tempo; primeiro. Fonte iDicionário Aulete