Consultar sobre saúde na web pode gerar sintomas inexistentes

por Luciana Ruffo – Psicóloga componente do NPPI

Uma interessante mudança vem acontecendo nos últimos tempos, na relação médico–paciente. Até pouco tempo, apenas o médico detinha o conhecimento total sobre as doenças.

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Os livros e pesquisas sobre medicina eram muito específicos e de difícil acesso para a população em geral, mas de algum tempo para cá essa situação tem se transformado.

Com a chegada da Internet e a disponibilização de ferramentas de buscas como o Google, tem sido cada vez mais fácil encontrarmos informações, tanto em linguagem leiga como em linguagem médica, sobre quase todas as doenças.

Mas, o que isso trás de mudança na relação entre médico e paciente?

Alguns estudos mostram que quando o paciente se informa e participa mais dos cuidados frente à sua doença sua recuperação acontece de forma mais rápida e eficaz. Psicologicamente falando, nessa nova condição a doença deixa de ser algo desconhecido, que se apoderou do corpo do ‘paciente’ e que apenas vai poder desaparecer quando um “mago” médico lhe passar a fórmula mágica, ou seja, pois agora ele se torna também um ‘agente’ da situação.

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Ele passa a entender como contraiu a doença, o que pode fazer para melhorar, o que ela faz no seu organismo e efetivamente como o médico está lhe auxiliando.

Um bom médico fornece ao paciente todas as informações que este precisa saber sobre sua doença, e sobre sua possível evolução. Mas, eventualmente, encontramos casos onde o médico, por diversas razões (falta de tempo ou de disposição emocional para lidar com o sofrimento do outro, entre tantas outras) não passa a ele tudo aquilo que o paciente gostaria de saber. Assim muitas pessoas começaram a recorrer a esse instrumento apelidado de “Dr. Google”. Você digita o nome da doença no campo adequado (www.google.com.br) e, em instantes, receberá na tela do seu computador inúmeros ‘links’ (endereços) contendo explicações, relatos de casos semelhantes, e seus respectivos tratamentos e progressos.

Isso é bom? Em parte sim. Como o interesse do paciente em resolver o problema é grande, em casos raros ou doenças crônicas, o indivíduo poderá de fato encontrar dados de pesquisas que eventualmente podem ser de alguma ajuda. Recentemente foi apresentado em um programa de televisão o caso de uma pessoa portadora de uma doença rara, que, ao ser diagnosticado pesquisou a respeito na Internet. Essa busca possibilitou ao paciente encontrar um médico, do outro lado do mundo, que havia feito um tratamento diferenciado para um caso parecido e obtido sucesso. Sucesso esse que pode ser aplicado ao paciente em questão, depois que essa pessoa se comunicou com seu médico, e este, por sua vez, comunicou-se com o outro cuidador.

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O fato do paciente se interessar pode realmente ajudá-lo a melhorar, porém, em alguns casos pode gerar sofrimentos e ansiedades desnecessárias. Se um paciente lê um prognóstico ruim para uma doença semelhante à sua, por não conhecer todos os detalhes – e envolvido que está por emoções, na situação – poderá acabar achando que seu prognóstico será o mesmo, e assim entrar em desespero por conta de uma suposição que talvez nem mesmo se aplique ao seu caso pessoal.

Também existe a situação onde pessoas impressionáveis – ou excessivamente preocupadas com os temas da saúde – podem passar a se identificar com os relatos dos sintomas pesquisados e começar a ‘sentir’ (subjetivamente) os mesmos sinais relatados, transformando suas consultas médicas em um labirinto de queixas, o que pode se tornar um tormento (para si mesmo e para o seu médico!).

De qualquer forma a informação está disponível para todos. Temos de aprender a usá-la e tirar bons proveitos desse fato. Consultar informações, estruturar perguntas pertinentes e procurar o médico para esclarecê-las é um ótimo caminho. O que não podemos é achar que somos detentores de um saber que cabe aos médicos, que estudaram para tanto, e assim podem avaliar cada caso em suas particularidades.

Estudar, conhecer a fundo um problema ou doença que nos aflige, pode nos trazer muitos benefícios, desde que tenhamos o bom senso de saber que existem casos parecidos, mas com evoluções finais diferentes. Podemos até recorrer a esses achados para ampliar nosso diálogo com o médico que está nos cuidando. Porém, tendo consciência de que a efetiva condição para uma decisão final sobre os procedimentos a serem feitos ainda é prerrogativa do seu médico.