Psicoterapia: um espaço para experimentar

por Aurea Caetano 

A hipótese colocada aqui, em nosso último texto, diz respeito à capacidade de transformação do sistema de processamento dos robôs no seriado “Westworld”.

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Ora, máquinas construídas à nossa imagem e semelhança, esses robôs espelham muito do funcionamento de nossas mentes.

O cérebro humano está a todo o momento trabalhando a partir da seleção entre inúmeras informações internas e externas. Dispara então comandos a outros sistemas para responder a essas informações. Mas, não existe um sistema controlador, um processador interno que toma todas as decisões sozinho. Esse é um processo altamente complexo no qual todos os sistemas do corpo estão o tempo todo trocando informações e proporcionando um funcionamento global e não individual.

Esta ideia fez com que o cérebro tenha, nas últimas décadas, passado a ser reconhecido como um órgão adaptável e resiliente, não apenas durante seu desenvolvimento, mas também na vida adulta. O cérebro é capaz de se reorganizar através da formação de novas conexões neurais ao longo da vida.

A neuroplasticidade é uma resposta inata que permite, por exemplo, compensar um dano causado a uma área do cérebro ou a uma alteração no ambiente, ajustando sua atividade em resposta à nova situação. O cérebro opera de forma plástica, dinâmica e auto-organizadora, estando menos restrito a regiões predeterminadas do que se supunha.

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O conceito de neuroplasticidade é fundamental em nosso trabalho em psicoterapia. Estamos nós também, psicoterapeutas, trabalhando na alteração do processamento de informações do sistema e com isso favorecendo novas e dinâmicas reorganizações.

Segundo Von Bertalanffy (1968), um dos precursores da abordagem sistêmica, os organismos existem em um estado de equilíbrio dinâmico, isto é, buscam estímulos no ambiente e participam na construção de seu próprio desenvolvimento. Ou seja, organismos são capazes de auto-organização: uma reorganização altera o sistema de forma adaptativa, quando sujeito a novas limitações.

Como diz Cozolino, psicólogo americano estudioso do tema, o cérebro é um órgão social, e a atualização do potencial de cada ser humano irá depender das experiências de vida e de como essas formaram as redes neurais. Apesar dos mecanismos serem específicos, as pesquisas em neuroplasticidade sugerem que experiências exploratórias, desafiadoras, podem nos levar ao desenvolvimento de tecidos cerebrais de forma análoga ao desenvolvimento que a prática de atividades físicas promove nos músculos.

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Interessante, não? Esses autores propõem pensar a psicoterapia como um “espaço” protegido no qual podemos experimentar novas experiências, outras possibilidades de olhar, que nos provocam e desafiam, contribuindo para um enriquecimento do funcionamento do sistema como um todo.

E, voltando aos robôs do seriado… Poderemos pensar também em uma espécie de neuroplasticidade? Estarão essas máquinas, quase humanas, também aprendendo, se reorganizando a partir das várias experiências e assim transformando seu funcionamento?