Pais: não acelerem, nem brequem o processo de autonomia dos filhos

por Ceres Alves Araujo

Autonomia pode ser definida como a capacidade de se governar pelos próprios meios, o que acarretará o direito de se tomar decisões livremente. Não é uma capacidade própria à criança, mas os precursores dela, sem dúvida, se encontram na infância.

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A capacidade de se autodeterminar, de estabelecer as próprias leis envolvem dois aspectos: o primeiro se refere ao poder de determinar a própria lei, isto é de imaginar, de conceber e de decidir; o segundo está relacionado à capacidade de agir, que, além de estar na dependência das próprias competências, pressupõe a reflexão e a mediação entre as pressões dos impulsos internos e as pressões das convenções sociais e morais. É uma capacidade complexa, que é adquirida progressivamente ao longo do processo do desenvolvimento da pessoa.

Sabe-se que o ser humano é um caso de prematuridade entre as espécies. Diferente dos outros animais, ao nascer, o filhote humano não sobrevive se não for cuidado. Ele não desenvolve a mente se não estiver em interação com um outro ser da mesma espécie. A capacidade de autonomia e a noção da própria autonomia, nulas ao nascer, vão se desenvolvendo com relativa rapidez desde a infância. Bem jovem, a criança começa a perceber que ela é o agente do seu movimento, que ela é o agente responsável por transformações em si mesma e no ambiente. Ganha o senso de autoria, de agente dos seus pensamentos e das suas ações e passa a interpretar como seu, tudo aquilo que acontece dentro de si. Essa é a base para a noção da própria identidade.

Ao sorrir e fazer o outro sorrir, ao emitir sons e ser correspondido, ao chorar para conseguir chamar atenção, ao jogar objetos para o outro pegar, o bebê vai se percebendo dono da sua ação. Algumas aquisições no desenvolvimento são marcos para o desenvolvimento da autonomia da criança, dentre elas pode-se citar: a aquisição da marcha, da linguagem, o controle do xixi, o alimentar-se, o tomar banho, o vestir-se e o dormir sozinho. Cumpre aos pais incentivar e reforçar tais aquisições, sabendo que estão facilitando o processo de ganho de autonomia de seus filhos.

Alfabetização: autonomia e autovalorização

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Um marco fundamental nesse processo é a alfabetização. Ganhar a possibilidade de decifrar o código escrito maravilha a criança. Ela vai juntando letras, sílabas, sons e de repente surge a palavra e seu sentido como uma mágica! A criança não tem consciência de que está ganhando um acesso importante ao mundo da cultura, mas experimenta, nessa idade, uma sensação, talvez insuperável, de poder, de autonomia e de
autovalorização.

Daí, por exemplo, a importância da alfabetização ser um processo prazeroso. Para ser prazeroso precisa ser compatível com o desenvolvimento neuropsicológico da criança. Apressar tal processo pode ser prejudicial.

Aliás, cumpre salientar que as aquisições de autonomia são relativas, variando com a idade da criança. Os pais devem tomar cuidado para não forçarem seus filhos a terem autonomia em relação a uma determinada conduta quando a criança ainda não está preparada para tal autonomia. Caso seja forçada, irá gerar dor, frustração e estresse para a criança, prejudicando sua autoestima.

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Da mesma maneira que a autonomia, a autoestima não é inata mas é adquirida com o crescimento. E ela está ligada aos precursores do ganho da autonomia, isto é aos ganhos de competências e à noção de que se é competente.

Durante toda a trajetória do desenvolvimento humano, novos aprendizados acontecem, competências diferentes são adquiridas em geral com esforço e disciplina, visando-se sempre maior grau de autonomia. A adolescência constitui um grande treino dessa autonomia, pois é preciso separar-se do mundo dos pais, deixar de ser filho e o grande desafio é tornar-se uma pessoa autônoma no mundo dos adultos. Diferentes formas de autonomia são esperadas e necessárias à autoestima e autoconfiança.

Resilientes são os seres humanos que desde o inicio da vida se desenvolvem no sentido da busca da capacidade de se autodeterminar, de ter o direito de se tomar suas decisões livremente e de procurar estabelecer as próprias leis na sua adaptação ao mundo.

Portanto, a busca pela autonomia é um processo natural ao ser humano. Ela começa bem cedo na vida. Cabe aos pais auxiliar seus filhos nesse processo, tomando os devidos cuidados para não acelerarem essa caminhada e também não brecarem o impulso à autonomia da criança e do adolescente. Dar tempo ao tempo nas conquistas da autonomia, favorece a autoestima do ser em crescimento dentro de um processo de desenvolvimento natural humano.