A beleza não mora nas coisas, mora na luz do nosso olhar

Por Patrícia Gebrim
 
Quando pequena, eu costumava passear por entre as árvores em um lugarzinho que sempre me foi mágico e especial. Talvez por ainda estar próxima da idade na qual fantasia e realidade se fundem, ou talvez por ainda ouvir a voz de minha alma, nenhuma de minhas caminhadas naquele lugar era ordinária. Algo especial sempre acontecia. Um barulho inesperado, o voo rasante de um pássaro, que de tão azul mais parecia um pedacinho do céu, um cogumelo que se posicionava estrategicamente sob meus pés, só para liberar aquela chuva de pontinhos luminosos ao ser distraidamente pisado por mim.

Naqueles passeios muita magia acontecia e, se é que existem fadas, elas me acompanhavam de perto, todos os dias e eu juro que podia ouvir sons de seus sininhos perto da cachoeira. Existiam alguns elementos especiais naquele passeio. Uma árvore que me era muito querida, eu a chamava de guardiã do vale. Um pássaro que, mesmo aparentemente distante, me acompanhava de perto. Um pequeno campo de margaridas, que sempre me saudava, ao som do vento, no final do entardecer.

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Por muitos anos visitei esse lugar. Estar lá me dava a certeza de que o mundo era um lugar bom e que o amor pulsava em cada minúsculo pedaço deste Universo. Mas então, como acontece com todos nós, a vida exigiu que eu crescesse. Num dia qualquer, ao chegar em meu lugar sagrado, meu coração se partiu em mil pedaços. A mata tinha sido queimada e nada restara daquele lugar sagrado. Não vi borboletas ou pássaros. Não encontrei os cogumelos, a árvore tinha morrido e eu já não ouvia os sinos das fadas. Minha sensação foi de ter morrido um pouco naquele dia. Chorei por um bom tempo, me perguntando o sentido desta vida.

O tempo passou e passei a evitar a natureza. Tudo me lembrava da tristeza daquela vegetação devastada pelo fogo. Tentei me afastar de tudo que pudesse me lembrar dos verdejantes campos floridos que um dia tinham dado o único sentido verdadeiro à minha vida.

Cresci, construí coisas, aprendi outras, fui a todos os cantos do mundo, fortemente decidida a jamais amar um lugar como tinha amado aquela floresta. Tinha medo de amar e perder novamente. Um dia, a vida, soberana que é, decidiu que isso teria que mudar.

Estava eu me dirigindo a meu trabalho, percorrendo o mesmo caminho de sempre, que nada tinha de especial, quando vi a menina. Pequena, cabelos louros cacheados, algo nela chamou minha atenção. Estava abaixada ao lado da calçada, perigosamente perto da área por onde circulavam os carros, bem onde um fiozinho de água suja escorria. Curiosa, me aproximei devagar, abaixei a seu lado e perguntei a ela o que fazia. Ela colocou as mãos sobre os lábios e me pediu que eu fizesse silêncio.

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_ Ouça! _ disse ela.
_ Ouça o que, querida? _ perguntei.
_ As fadinhas!

E foi como se um choque percorresse meu corpo. E então… O som!

Os sininhos tão conhecidos. O tilintar das fadas! Fechei os olhos por um momento e subitamente, do meio do asfalto, foi como se levantassem voo as mais lindas borboletas, e o vento tivesse soprado bonito e cheio de vida, e as árvores ao redor fossem majestosas como já tinham sido um dia.

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_ Sabe, a beleza se esconde às vezes, mas ela nunca morre. _ Disse ela, sorrindo.

Reconheci naqueles olhinhos as mesmas estrelas que brilharam nos meus um dia. Compreendi então que a beleza não mora nas coisas.

A beleza mora na luz do nosso olhar.

Às vezes o vento sopra e nos sacode por dentro.

Às vezes as árvores dançam e dos galhos caem chuvas de bênçãos.

O milagre acontece o tempo todo, há que se ter estrelas nos olhos.

Extraído do livro de Patrícia Gebrim “Deixe a Selva para os leões – Inspirações para bem viver nos dias de hoje” – para ler capítulo anterior – clique aqui.