De A a Z: o significado da liberdade dentro do casamento

Verbete explicado a partir do e-mail enviado por uma leitora:

“Sou casada há 16 anos e nosso relacionamento existe desde os meus 15 anos. Hoje tenho 42. Ele foi meu primeiro homem, ele me ama, perdoou uma tentativa de traição minha quando tínhamos 4 anos de casados; e tolerou deslizes que vez ou outra cometia. Temos uma filha de 11 anos. Sou muito vaidosa e gosto de ser notada pelos homens… Ele sabe e não liga. Mas tenho meu outro lado com postura de esposa e boa mãe perante a sociedade. Não transpareço minha luxúria ao mundo, só entre quatro paredes. Mas sou ciumenta e não tolero que ele tenha contato mais próximo com amigas nossas, que repare em outras mulheres. Sei no fundo que como seduzo as pessoas à minha volta, zelo para que ele não faça isso. Sinto que o amo porque ele me ama e ele me aceita errada como sou desde nova. Ele sabe que posso voltar a traí-lo, mas é nítido que ele prefere ficar comigo, mesmo eu não sendo a mulher perfeita. Eu estou envolvida há um ano com outro homem também casado, mas essa relação é basicamente sexual, pois ambos temos quase certo que jamais daria certo nos assumirmos. Ele tem 10 anos menos que eu mas é bem-sucedido e agora vai ser pai. Não tem nada que favoreça para largarmos tudo e nos assumir. Apesar de que, se ele me pedisse para ficar com ele, eu acho que aceitaria sem medo, pois tenho gana de mudar minha vida. A questão é: por que mesmo sentindo amor pelo meu marido, não consigo largá-lo, mesmo sem ter interesse sexual nele há anos? Por que me vejo em busca de paixões que me avassalam, mas que acabam tornando-se apenas mais uma experiência? Sinto meu comportamento contraditório em ser a mulher, que é casada, trabalha, tem filho e luta diariamente com a vontade de ser livre e conquistar quem eu quiser… Eu me seguro, pois o meio social me faz buscar ser correta, mas no fundo, meu lado infiel sempre ressurge. Como faço para escolher um lado e não ter essa vida dupla?"

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Por Anette Lewin
 
Você descreve muito bem seus sentimentos, suas contradições internas, suas necessidades e seus desejos. Parece uma pessoa bastante desenvolvida em relação a autoconhecimento e empatia. Não é à toa que conseguiu conquistar uma pessoa que aceita e respeita você do jeito que é, com seus defeitos e qualidades.

Mas entender nem sempre é suficiente para aceitar. No seu caso o que está em desequilíbrio é a culpa; a sensação de que você  tem que optar por algumas das suas necessidades e abrir mão de outras para se sentir aliviada. É como se você tivesse encontrado um equilíbrio, mas se recusasse a assumi-lo totalmente porque esse equilíbrio não é o que a sociedade prega como correto. E não é o que a educação que teve ensinou a você.

Recapitulando: você tem um marido que gosta de você e aceita suas escorregadas sem querer mudá-la. Você tem um amante mas, segundo suas palavras, “ não expõe sua luxúria ao mundo, só entre quatro paredes”. Entende-se que suas conquistas amorosas são mantidas de forma discreta, sem expor seu marido. Você sabe que a relação com seu amante se baseia em sexo, funciona porque não existe compromisso e dificilmente uma relação de casamento com ele traria a você o mesmo conforto que o casamento com seu marido traz. Você ama seu marido e, tirando o sexo, se sente bem com o que ele lhe proporciona. Menciona também, nas entrelinhas, que tem uma certa atração pelo risco, quando diz “ tenho gana de mudar minha vida”. Por outro lado, deixa claro que do jeito que vive, consegue conciliar suas necessidades sem se arriscar numa escolha da qual pode se arrepender depois.

Então, talvez seja importante você repensar se a única solução para a sua vida amorosa é optar por continuar casada ou se separar para viver uma vida livre, sem amarras e cheia de aventuras. Será? Talvez esse equilíbrio que você encontrou seja o melhor neste momento. Se você estivesse sendo pressionada pelo seu marido, ou pelo seu amante, talvez escolher fosse imperativo. Mas não é o que acontece. A pressão vem de dentro e baseia-se apenas em culpa, pois nenhuma das duas relações está esgotada nem para você, nem para eles.

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Talvez um dia você sinta realmente uma necessidade de uma parceria única, mas não é o que acontece agora. É claro que você tem o livre-arbítrio e pode concluir que quer viver sem culpas. Ok. Vamos começar tudo de novo.

Você larga seu marido e sai por aí livre, leve e solta para ficar com quem quiser quando quiser. Será que isso não a levará, segundo suas próprias palavras, a buscar paixões que avassalam, mas acabam por se tornar apenas mais uma experiência? Será que a liberdade de poder ficar com quem quiser de forma lícita não acaba ficando sem graça porque não embute o ilícito, o risco, que são características que também fazem parte de suas necessidades? Será que o vazio não seria uma consequência de tudo isso?

E se você largar seu amante, que afinal não expressou a vontade de assumir um relacionamento mais profundo com você, e assumir ser fiel ao seu marido? Como fica o seu lado aventureiro? Claro, você pode buscar novas “aventuras” fora do campo amoroso e sexual. Talvez um dia até faça isso. Mas está disposta a deixar de seduzir e jogar um jogo que ainda não se esgotou para você? E, como será a reação de seu marido à sua postura mais passiva? Afinal, ele gosta de você do jeito que é, com a mobilização e os riscos que você proporciona a ele. Sim, ele sabe que você pode embarcar numa aventura e largá-lo e aceita isso. Será que mudando seu jeito você não correria o risco de perdê-lo para outra mulher mais mobilizadora? Afinal, foi isso que ele viu em você.

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Todos esses pontos devem ser levados em consideração antes de sair do equilíbrio em que você se encontra. Reavalie sua culpa e, se possível, converse com seu marido. Vocês já estabeleceram um contrato entre vocês onde ele aceita seu lado sedutor e até suas escapadas. E é apenas a ele que você deve satisfações. A rigor, não existe traição, mas uma relação parcialmente aberta. Talvez esteja na hora de renovar esse contrato através de uma boa conversa e tirar esse peso dos seus ombros.
 

Atenção!
Este texto não substitui uma consulta ou acompanhamento de um psicólogo e não se caracteriza como sendo um atendimento.