Pessoas descartáveis: a paixão está em desuso?

Por Andrea Lorena

A tecnologia nos trouxe muitas facilidades para o dia a dia dos relacionamentos. Lembro que aos meus 16 anos, quando conheci o chat do MSN, era o “must-have” da época: podíamos conversar com nossos amigos e “paqueras” (o nome usado naqueles tempos) sem sair de casa. Geralmente, antes de ir para o mundo virtual, tínhamos que conhecer a pessoa no mundo “real”, conversar, mostrar o rosto tímido, nervoso, feliz ou qualquer outra emoção que estivesse aflorada naquele instante. Tínhamos que gastar tempo e energia para conseguir o e-mail e aí assim, adicionar o crush (nome atual de paquera. Evolução, não?).

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Mas tanta tecnologia também trouxe efeitos colaterais para os relacionamentos amorosos. Com a comunicação mais rápida e podendo ser feita de qualquer lugar, não mais precisamos conhecer a pessoa no mundo no real. Podemos conhecer novos crushs a qualquer momento através de aplicativos. Existem aos montes. Bastam alguns cliques, algumas trocas de conversas e já se pode encontrar ao vivo e a cores. Depois disso, se passar da primeira noite, pode durar mais alguns poucos meses. Não é uma regra geral, obviamente, mas pelas minhas observações é assim que anda acontecendo.

O tempo das relações X o tempo da paixão

Nesse curto período de tempo, mal deu para as pessoas se apaixonarem efetivamente. Parece ser somente uma “empolgação” de momento. A paixão geralmente dura um ano ou um pouco mais, tempo suficiente para namorar, acasalar, procriar e cuidar da prole. É marcada por pensamentos constantes sobre o novo amor. O apaixonado faz planos para encontrar, paparicar, transar, conquistar e manter o relacionamento. Em seguida, para aqueles casais que durarem mais do que isso, começa a fase do amor.

Conquistar e manter são verbos essenciais em qualquer estágio do relacionamento amoroso. Dá trabalho, gasta energia e paciência. Quando correspondido, ganha-se toda aquela recompensa (que conhecemos muito bem) e assim prossegue o relacionamento.

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No entanto, com a facilidade dos aplicativos, nos quais as pessoas estão à disposição de um clique, parece não haver mais a necessidade de conquista: “se a pessoa A não me quiser, ok, tem a pessoa B”, e assim sucessivamente.

Paixão parece estar em desuso

Ao menor sinal de frustração ou desagrado, o indivíduo pula fora. Paixão parece estar em desuso e fora de cogitação. Apaixonar-se envolve dedicação e conciliar interesses comuns e mútuos. Na mesma velocidade que os dados trafegam na rede, os relacionamentos começam e terminam. Não há tempo para paixão. Há tempo para diversão, mas sem envolvimento emocional. Para que entrar em contato com as inseguranças pessoais e medos, se, o meu crush pode simplesmente não me atender amanhã? Não há necessidade de se apaixonar, uma vez que se pode trocar de crush ou ainda, ter vários ao mesmo tempo.

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Atualmente, as pessoas se tratam cada vez mais como descartáveis: “se não atendem aos meus desejos, não tem porque ficar junto”. Porém, isto aflora cada vez mais a carência e as temidas inseguranças emocionais.

Nosso cérebro foi programado para se conectar e se vincular através do nosso “sistema de apego”. Logo, mesmo que conscientemente o indivíduo não queria se vincular a algum parceiro romântico, este sistema joga este indivíduo “na pista” novamente. E recomeça o ciclo: encontra o crush, fica, transa e vai embora.

Daí vem um questionamento: não seria mais fácil entender e resolver a insegurança, a frustração e o medo de se relacionar? Aqui, claro, excluem-se aquelas pessoas que já fizeram este processo e concluíram que preferem não ter relacionamento amoroso fixo.

E lembre-se: se o outro para mim é descartável, provavelmente, já fui descartável para outrem.