Como contar aos filhos do casamento anterior que eles vão ganhar um irmãozinho?

E-mail enviado por um leitor:

“Nunca imaginei recorrer à internet para esse assunto mas… rendo-me! Tenho dois filhos do primeiro casamento, um com 6 anos e outro com 3. Casei novamente e tive meu terceiro filho com minha atual esposa muito em seguida do término do outro casamento. Apesar de não ter sido traição (menos ainda desrespeito), de certa maneira é um assunto delicado por parecer que desmereci e descartei – insensivelmente – a relação anterior. Dito isso, minha pergunta e pedido de ajuda é: quando e como devo abrir para meus filhos (6 e 3 anos), do primeiro casamento, que eles têm um irmãozinho, mas que jamais pensem que toda e qualquer distância que haja entre nós é por ‘culpa’ do caçula do casamento atual?

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Acho importante acrescentar os seguintes fatores/detalhes da história, para que possam tentar me guiar pelo melhor caminho… Eu fui filho da "outra" e escondido da família do meu pai até os quatro anos de idade. Enquanto isso hoje está "conscientemente" resolvido, sem dúvida pesa no que diz respeito a uma nítida repetição que vivo, espelhada em meu próprio pai. Além disso, minha preocupação sobre o como contar para meus filhos é sem dúvida agravada pelo fato de que vivo no Brasil com minha atual esposa e terceiro filho (com 6 meses de vida) e meus dois filhos do casamento anterior vivem nos EUA. Diante disso, deixo claro que não estou buscando "colo" nem também ‘vitimismo’, achando que minha situação é o fim do mundo… Porém, honestamente, por mais que eu reflita, analise, simule o máximo de possibilidades para e como agir, inevitavelmente não tenho ‘feedbacks’ imparciais quando me abro sobre o assunto. Espero MUITÍSSIMO que alguém possa me iluminar com alguma(s) palavra(s) que me direcione para fazer o melhor para meus filhos. Desde já agradeço e conto com as mais diretas e sinceras opiniões/visões.”

Resposta: Você percebeu que está repetindo um padrão de comportamento de seu pai e gostaria de sair desse aprisionamento neurótico adotando uma solução mais adequada e que tenha mais a sua cara, certo?

Bem, uma parte da história já se repetiu e, com relação a ela não há o que fazer. Seus filhos vão saber que têm um irmãozinho sem terem sido preparados, no momento em que esse irmãozinho era gerado, para o nascimento dele.  Como são pequenos, nada de muito grave… Mas a continuação dessa história pode ser diferente. Para isso, o mais importante é você refletir sobre como é seu próprio jeito de lidar com questões polêmicas.

Dilema

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Sabemos que o jeito do seu pai foi adiar a situação até que, por algum motivo, que não é relatado em seu e-mail, a verdade veio à tona. Voltando a você: certamente essa não é a primeira vez que você se encontra frente a um dilema, então tente entender como agiu nos outros dilemas que encontrou pela frente: resolveu rápido? Pensou bastante antes de agir? Pensou no seu desconforto ou no desconforto dos envolvidos? Sentiu-se bem com a solução que deu ao dilema? Arrependeu-se? Sim, todas essas perguntas devem ser feitas para que você entenda como é seu jeito de resolver problemas e possa usá-lo conscientemente.

Certamente, independentemente do resultado, resolver com a sua cabeça, baseado em suas próprias experiências, é melhor do que adotar um modelo de terceiros. Você já ouviu “conselhos” e não se sentiu à vontade com eles, certo? Certíssimo. Conselhos são apenas conselhos. Podem ser ouvidos, mas devem ser avaliados para ver se servem ou não para você. A palavra final sempre será sua com todos os seus ônus e bônus.

Possível bloqueio

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Existe uma possibilidade de, após essa reflexão, você entender que seu jeito de agir não seria muito diferente do jeito que seu pai usou… Afinal, você relata que para você, esse problema está “conscientemente” resolvido. Aspas suas que sugerem que, do ponto de vista emocional,  pode haver ainda algum bloqueio. Certo. Mas você não me parece uma pessoa que ficou paralisada por um trauma emocional profundo em função de ser filho da “outra” ou de se sentir o motivo de todas as infelicidades dos seus meio-irmãos, certo? Ou ficou? Esse ponto também é um ponto que deve ser retomado neste momento.

Caso você conclua que seu jeito de resolver questões polêmicas é diferente do jeito do seu pai, direcione suas ações no sentido de respeitar esse jeito. Por exemplo: você, em seus dilemas no passado, tomou a iniciativa de resolver a questão trazendo-a à tona ou esperou até que alguém tomasse essa iniciativa por você? Se você entende que seu jeito de ser é tomar a dianteira para tentar resolver, talvez deva fazer isso agora: preparar seus filhos e contar-lhes que têm um irmãozinho que mora no Brasil e que, um dia eles vão conhecer.

Como apresentar o irmãozinho?
 

Claro que a forma de prepará-los deve ser delicada, tentando apresentar o irmãozinho como algo positivo na vida deles, mas nada garante que a reação deles seja boa ou ruim. Um deles pode se sentir enciumado e o outro não: os dois podem ser “envenenados” pela mãe (afinal eles têm uma mãe) e ficar confusos; os dois podem receber a notícia do irmão como um presente. Enfim, tudo pode acontecer. Sua função é a de contar de uma forma delicada, positiva e realista. O resto não depende só de você!

Além do mais, como você menciona no início de seu e-mail, as coisas mudam, as visões das pessoas também mudam. Você nunca pensou em “recorrer à internet” e está recorrendo; nunca imaginou repetir a história do seu pai e está repetindo. Da mesma forma seus filhos, todos eles, podem construir visões sobre a família que mudarão com o tempo. Talvez essa seja uma grande lição que você pode passar a eles: situações mudam, sentimentos mudam, casamentos acabam, outros recomeçam.

Alimentar culpas por mudanças ou repetição de padrões de comportamento só complica. Enfim, assuma sua vida, seu jeito de ser e continue se esforçando para conhecer-se cada vez melhor, através de reflexões, amigos, e por que não, através da polêmica “internet”. Cujas opiniões são apenas opiniões que podem ajudá-lo a acrescentar novas formas de refletir sobre fatos que você já conhece. Sem deixar de lado seu jeito pessoal de agir. Acredite em você, respeite seu jeito e sua própria história e lembre que relacionamentos são jogos em que cada passo está atrelado ao passo anterior do parceiro. Você não joga sozinho.

Atenção!
Este texto não substitui uma consulta ou acompanhamento de um psicólogo e não se caracteriza como sendo um atendimento.