Por que os filhos estão cada vez mais sem limites?

Acredito que um dos temas mais frequentes sobre os quais escrevi nessa coluna, foi sobre limites. Porém, mais do que nunca é importante ressaltar a importância das  normas, das regras e da disciplina na educação das crianças e discutir também sobre princípios e valores, aos quais elas estão relacionadas.

No desenvolvimento humano, é sabido que o controle sobre os impulsos, a regulação das emoções, a aquisição da capacidade para entreter tensão interna e para tolerar frustração é o que nos faz humanos, diferentes dos animais. Essas aquisições são padrões relacionados à evolução do homo sapiens-sapiens, do homem que sabe que sabe, que reflete sobre o que pensa e que planeja sua ação.

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Aumenta o número de crianças que não sabe lidar com a frustração

Cada vez mais, nos últimos tempos, psicólogos e médicos têm recebido crianças que não admitem serem contrariadas, que não aceitam “não”, que não sabem lidar com qualquer frustração, que não aceitam comandos, que não estão aprendendo a levar em consideração os desejos dos outros que estão junto a elas. Onipotentes, são crianças que acreditam que elas mandam na casa, tornando os adultos meros serviçais.

Nessa mesma linha, os profissionais de ajuda estão sendo procurados por pais de adolescentes que não respeitam qualquer regra que eles queiram colocar, que os desacatam, desvalorizam, que não se responsabilizam por suas ações e que acreditam poder fazer tudo o que desejam.

Filhos tiranos

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São filhos que se transformam em tiranos em casa e que, na adolescência, podem ter a agressividade muito aumentada, causando danos físicos aos pais e irmãos. Muitas vezes, a escola se torna para esses filhos, um ambiente de continência, contenção e segurança. As regras são claras e as expectativas em relação à adaptação acadêmica e social do aluno são explicitadas continuamente. Além disso, as regras e as expectativas valem para todos e inclusive os professores estão sob o comando e controle da instituição de ensino. Existe uma hierarquia e as figuras de autoridade se colocam com firmeza. Em relação aos colegas, o aluno aprende a discriminar as situações onde pode se impor e onde deve ceder, para não correr o risco de ser marginalizado.  

Dessa forma, o ambiente escolar, com frequência,  pode se tornar terapêutico para a criança proveniente de um ambiente familiar permissivo demais. E essa criança evolui, podendo se adaptar muito satisfatoriamente à escola, que não formula nenhuma queixa a respeito dela, mas, em casa, ela continua sendo o ser opositor, mal- educado, intolerante, agressivo e prepotente.

Falta de respeito e agressão

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Outras vezes, entretanto, mesmo na escola a criança não consegue se adaptar, repetindo a mesma conduta da casa, na classe. Do mesmo modo que não respeita os pais, não respeita os professores. Ela não faz o que eles pedem, não se interessa pelo aprendizado, recusa-se a colaborar com quaisquer que sejam as demandas.  Em relação aos colegas, o padrão, que mais frequentemente se observa, é a agressão maldosa ao outro, podendo essa criança se tornar o líder de situações de bullying.  Não é raro a agressão direta ao colegas, as quais evoluem desde as mordidas e puxões de cabelo, naturais nos bem pequenos, até os empurrões, socos, pontapés, tentativas de enforcamento e até à sujeição do colega, obrigado a condutas humilhantes e mesmo a condutas que podem lhe causar risco de vida.

Na minha prática clínica, tenho visto aumentar assustadoramente o número de crianças e adolescentes que não estão sendo adequadamente criados e educados e que estão se transformando em seres não civilizados, vazios de experiências amorosas, que não sabem o que é solidariedade, companheirismo e que não se capacitam para trocas afetivas e nem mesmo cognitivas. O risco maior ainda é uma progressão para os transtornos de conduta, para a delinquência e para as sociopatias a seguir. 

O ser humano nasce impulsivo, uns mais que os outros, mas a impulsividade não caracteriza patologia. Caso seja adequadamente controlada, bem canalizada, é o motor para a ação no mundo.



Crianças mais agressivas são como carros superpotentes, precisam de superfreios

Eu costumo usar uma analogia nas orientações que dou aos pais, explicando que algumas crianças que nascem mais agressivas são como carros com motores superpotentes e que precisam adquirir freios igualmente potentes. Se um carro tem um motor muito forte e os freios fracos de um carrinho velho, vai trombar no primeiro muro que encontrar. No caso da criança bem impulsiva, que em geral tem birras fortes, é necessário que sejam colocados limites muito claros, estáveis e inflexíveis, para que ela adquira os freios necessários.

Eu costumo também dizer que falar “sim” para um filho é muito fácil, difícil é dizer “não”. Dá trabalho, custa tempo, repetições, mas dizer ‘não” nessas situações, é a maior prova de amor que se pode dar aos filhos.

Na nossa cultura, na nossa sociedade, nesse momento, urge se pensar sobre a importância da colocação de limites e interdições na educação de nossas crianças.