Dimensão atribuída aos problemas é subjetiva

por Monica Aiub

No artigo anterior (clique aqui), abordei problemas circunstanciais e a forma como lidamos com eles. A maneira como tratamos nossos problemas, às vezes, relaciona-se, diretamente, com pesos, medidas e dimensões que atribuímos a eles.

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Obviamente, você deve ter percebido que lida de maneiras diversas com diferentes problemas. Também deve ter percebido que alguns problemas lhe preocupam mais que outros, merecem maior atenção. Você já notou equívocos no peso dado a um determinado problema? Por exemplo, não dar atenção a ele, considerando-o menor e, posteriormente observar que ele era bem maior do que você imaginava? Ou, por exemplo, dar demasiada atenção a ele e depois perceber que era muito menor e, por isso, você não precisava sofrer tanto com ele?

Peirce, num artigo sobre a doutrina dos acasos, publicado na coletânea intitulada Ilustrações da Lógica da Ciência, descreve um jogador que tenta a aposta denominada martingale, que alguns consideram infalível. Assim ele descreve o método: “Neste método de jogar, o jogador primeiramente aposta, digamos, $ 1; se perder, passa a apostar $ 2; se perder agora, aposta $ 4; e se perder novamente, aposta $ 8; e se então ganhar, ele perdeu 1 + 2+ 4 = 7, mas ganhou $ 1 a mais; e não importa quantas apostas ele perca, a primeira que ele ganha faz com que ele fique $ 1 mais rico do que de início”. Peirce continua o texto demonstrando o paradoxo do jogador, “Segundo o qual, embora a ruína seja certa, o valor de suas expectativas, calculadas de acordo com as regras usuais, é grande. Entretanto, se um jogador jogar desse modo ou de qualquer outro, a mesma coisa é dada como certa, a saber, se ele jogar o bastante ele pode estar certo de que, em certa hora, ele terá uma série de azares que vai consumir sua fortuna inteira”.

A questão é: se o jogador sabe que uma hora ele consumirá toda a sua fortuna jogando, o que o faz jogar? Mas Peirce vai mais longe em seu artigo, aplica o paradoxo do jogador a uma companhia de seguros, que sabe que, mais cedo ou mais tarde, a ruína estará certa, porque ocorrerá um acidente que não poderá ser coberto sem levar a companhia à falência. Mas ele ainda prossegue, afirmando que todos os negócios são assim, que a própria vida humana é assim: uma hora, por probabilidade, as coisas podem dar errado. Mesmo assim, nós continuamos.

O autor afirma que “Para serem lógicos, os homens não podem ser egoístas; e de fato eles não são tão egoístas como se costuma pensar”. Para demonstrar sua tese, Peirce faz uso de três sentimentos: “interesse em uma comunidade indefinida, reconhecimento da possibilidade desse interesse tornar-se supremo, e esperança na continuação ilimitada da atividade intelectual”. Ele compara os três sentimentos ao trio “caridade, fé e esperança”. Em outras palavras, sabemos que vamos morrer, ainda assim, fazemos muitas coisas e nos preocupamos e deixá-las como herança para as futuras gerações. Acreditamos que, apesar da morte, nossos projetos e ações terão continuidade, e nossas realizações permanecerão como contribuições à humanidade, e também acreditamos que a humanidade continuará a existir e que receberá e fará uso de nossas contribuições.

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Se avaliássemos apenas a probabilidade, num cálculo matemático dos resultados de nossas ações, será que as levaríamos adiante?

O que faz com que continuemos em nossas buscas, ainda que não tenhamos garantias de sucesso em nossos projetos?

O que faz com que permaneçamos em determinados caminhos que, matematicamente, parecem trazer prejuízos (de diferentes naturezas), mas subjetivamente nos trazem prazer?

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Em suas ações, você costuma avaliar as contribuições que deixará para as futuras gerações?

É curioso observar como uma mesma questão pode receber diferentes respostas, dependendo não somente da pessoa que responde, mas também de cada contexto, de cada relação, dos elementos envolvidos e seus respectivos pesos, medidas e dimensões subjetivos.

Observemos a questão de pesos, medidas e dimensões. Você consegue identificar como atribui pesos aos elementos do mundo ao seu redor?

O que pesa mais? O que pesa menos? O que significa peso?

Para alguns, o peso é a importância, para outros é o fardo a ser carregado. Há ainda aqueles que atribuem importância ao fardo a ser carregado, e por isso dão peso a determinados elementos. Algumas pessoas aliam peso a emoções, outras a buscas, outras, ainda, ao impacto do elemento avaliado em suas relações interpessoais. Observe como isso funciona para você.

Agora considere que você está diante de um problema circunstancial. Que peso há na circunstância? Às vezes, a circunstância, por ela, não traz esse peso; mas os elementos envolvidos, tais como valores, emoções, papéis existenciais, interseções, entre outros, tornam o problema muito pesado. Mas quem atribui o peso? Você, os outros com quem se relaciona, o contexto ou o que pensa a coletividade?

Pode ocorrer de uma sociedade atribuir um forte peso a determinadas situações, mas a pessoa envolvida nela não atribuir o mesmo peso. Assim, quando todos pensam que ela não conseguirá resolver o problema, porque ele é grande demais para ela, ela consegue lidar muito bem com ele. Mas também pode ocorrer o contrário disso: a sociedade não atribuir peso ao problema e a pessoa sim; o que poderá fazer com que ela, além de sofrer com o problema, também sofra com a incompreensão daqueles que a circundam.

Quais as medidas que você utiliza para atribuir pesos a suas vivências? Elas são sempre as mesmas? Por que você utiliza essas medidas e não outras? Essas medidas são partilhadas com as pessoas que convivem com você? A partilha ou não de tais medidas é motivo de choque?

Qual a relevância de observar pesos, medidas e dimensões subjetivos? Inicialmente, o fato de pautarmos algumas de nossas escolhas, ou formas para lidar com as questões circunstanciais, em tais medidas, já as torna relevantes. Mas o objetivo de tais questões aqui é provocá-lo a pensar sobre seus próprios processos, e neles, observar o quanto você super ou subdimensiona os elementos de sua existência, e como e por quais motivos faz isso. Você resolveria mais facilmente suas questões se atribuísse outra dimensão a elas? Seria mais leve lidar com seus problemas? Ou o peso seria maior?

Outro ponto que torna a questão relevante, é o fato de, socialmente, valorizarmos determinados aspectos, tomados como universais: lucro, um padrão de qualidade de vida, status e outros elementos são apresentados como sendo universalmente desejáveis, universalmente importantes. Por outro lado, nem todas as pessoas consideram os mesmos aspectos como importantes. Talvez grande parte daqueles que constituem nossa sociedade não pensem assim, nem coloquem tais elementos como determinantes de suas ações, mas essa é a ideia veiculada e somos tidos como loucos quando fazemos escolhas que fogem ao padrão apontado como determinante.

Assim, um negócio, que deveria ser avaliado objetivamente, a partir do cálculo de probabilidade dos lucros em tal investimento, poderá ser observado a partir de pesos diferentes e, consequentemente, apesar da probabilidade de seus resultados, fatores outros contribuírem para que a pessoa defina sua escolha ou não pelo empreendimento.

Se pode funcionar dessa maneira com negócios, que deveriam ter avaliações objetivas, como funciona com os elementos da subjetividade?

Como atribuir pesos a nossas emoções, dimensões a nossas buscas, medidas a nossos valores?

Insisto: o quanto a sua forma de atribuir pesos, medidas e dimensões interfere na possibilidade ou impossibilidade em lidar com suas questões?

Referências Bibliográficas:

PEIRCE, C. S. Ilustrações da Lógica da Ciência. São Paulo: Ideias &Letras, 2008.