Loira burra, gordo… marcas sociais têm o intuito de fragilizar seus alvos

por Roberto Goldkorn

Stigmatta é uma palavra latina que quer dizer estigmas de Cristo. São pessoas ao redor do mundo (sempre cristãs) que apresentam feridas nas palmas das mãos e até nos pés, como se tivessem sido pregadas na cruz. Mas essas marcas nada tem de "espiritual", quando não é uma simples fraude (e a maioria dos casos se encaixa nessa categoria) trata-se de um fenômeno estudado pela parapsicologia.

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A teleplastia ou ideoplastia acontece quando a mente profunda do indivíduo, hiperexcitado emocionalmente, consegue plasmar no seu próprio corpo físico marcas que tenham algum significado que em geral tem a ver com as crenças do indivíduo.

Na Idade Média, os caçadores de bruxas e hereges buscavam no corpo de suas vítimas as "marcas do diabo", que em geral eram pintas ou manchas de nascença. Mas para aqueles fanáticos ignorantes era motivo suficiente para lançar uma pessoa no rio com uma pedra amarrada no pescoço ou queimá-la viva.

Marcar uma pessoa para distingui-la do restante é ancestral

Marcar uma pessoa para distingui-la do restante, ou buscar essas marcas sempre foi um arquétipo associado à individualização. Índios de uma determinada tribo deformam seus corpos para se autoidentificarem; adolescentes pintam o cabelo de roxo ou de verde para se destacar da multidão ou se identificarem com a sua "tribo". Parece que esse comportamento, seja ele ostensivo ou gerado por um desequilíbrio psíquico, faz parte da batalha ancestral contra a vala comum em prol da individualização. Algumas pessoas parecem temer a dissolução no mundo onde todos os rostos se misturam, temem a tal hora do lusco-fusco onde "todos os gatos são pardos".

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Mas essa inclinação também serve a propósitos perversos. Os nazistas obrigavam os judeus a se identificarem (e se tornarem alvos) ao usar uma estrela de Davi tamanho família costurada em suas roupas. Quando não se usava um sinal, um povo ou grupo poderia ser marcado com um rótulo ideológico ou religioso: os infiéis, os hereges, os reacionários, os intocáveis e vai por aí.

Tirar alguém de um universo comum para colocá-lo sob a luz dos olhares e críticas tem sido ao longo do tempo uma forma de fragilizar essa pessoa ou grupos de pessoas. É um comportamento primitivo ainda que atual.

Marcas sociais

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Os apelidos ou alcunhas também servem ao propósito de "estigmatizar" alguém: são os "gordos", as "loiras burras", as periguetes" etc. Essas marcas sociais são como caricaturas que ressaltam de forma exagerada alguma característica da pessoa e abstraem todo o resto. O intuito é marcá-la, destacá-la da sociedade para que, fragilizada, fique mais fácil dominá-la.

Muitos pais se esforçam para já inaugurar a vida de seus pimpolhos diferenciando-os no berço marcando-os pelo nome esdrúxulo, como se isso fosse algum passaporte misterioso para a sua felicidade. Mas só irão conseguir estigmatizá-los e, além de terem de enfrentar a vida em seus infinitos desafios, ainda serão obrigados a carregar um nome que não irá lhes ajudar em nada nessa missão.

Esse é o "outro lado" de um arquétipo antigo de busca de diferenciação de individuação que provavelmente se iniciou quando não dispunhamos de nenhum elemento que nos ajudasse nesse sentido.

As marcas do flagelo atribuído a Jesus, ou um cabelo espetado e pintado de várias cores não irão contribuir para qualquer processo sadio de individuação, um nome estapafúrdio de tão "diferente" idem.

A busca de individuação, de se tornar um In-divíduo, é um processo de dentro para fora, é aprender a pensar a partir de sua própria experiência e não repetir pensamentos enlatados.

Ser um indivíduo, ser alguém com uma existência particular, própria, não coletiva, é um dilema antigo do homem: enquadrar-se no coletivo ou partir para uma jornada pessoal?

A resposta talvez não contemple nenhum dilema, pois o verdadeiro indivíduo sabe que o desenvolvimento espiritual só é alcançado quando encontramos o nosso caminho e nele a compaixão pelo coletivo nunca está excluída.