Não permita que o olhar do outro paralise você

por Patricia Gebrim

A vida em suas cenas cotidianas tem sido a minha inspiração para esta coluna e o que escrevo hoje não foge à regra.

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Costumo almoçar em um pequeno restaurante que fica bem em frente ao meu consultório. Basta atravessar a rua e lá me aguardam as saladinhas de que tanto gosto. Assim, hoje, em meu intervalo para o almoço, cruzei a rua em direção a um prato saudável de salada acompanhado de um suculento grelhado. Sentei-me em uma pequena mesa na parte externa do restaurante, gosto de comer observando o movimento das pessoas na rua. Lá pelo meio do almoço, uma chuva espessa e assustadora despencou em meio a uma súbita ventania, fazendo os guardanapos voarem divertidamente para todos os lados. Terminei de almoçar sem pressa, esperando que a cortina de água se tornasse menos intensa, sem sucesso. Como chovia!

Percebi que o horário de meu próximo atendimento estava cada vez mais próximo e que eu inevitavelmente teria que atravessar toda aquela água para chegar ao consultório. Apesar de se tratar de apenas alguns metros, observei a rua cheia de água e olhei para os meus sapatos novinhos, bege claro, com dor no coração.

Após avaliar a situação, percebi que a água era limpa, não oferecendo risco à minha saúde. Apenas tirei os sapatos, para o assombro das pessoas que estavam no restaurante, e calmamente caminhei até o outro lado da rua, entrando no prédio com os sapatos nas mãos, sob o olhar divertido da recepcionista.

Foram apenas uns 30 metros, mas algo naquela travessia me fez um bem que mal consigo descrever. Cheguei do outro lado da rua com uma deliciosa sensação de leveza. Talvez por me lembrar de tempos de criança em que andar descalça sob a chuva era a coisa mais deliciosa do mundo. Talvez pela liberdade de salvar meus sapatos, sem me preocupar tanto com o que as pessoas pensariam de mim.

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Dei-me conta de que eu não seria capaz de fazer algo assim há alguns anos atrás. Com certeza teria estragado meus sapatos, com medo do julgamento das pessoas:

– Como assim, a “psicóloga” atravessando a rua descalça???

Há alguns anos atrás eu teria medo de enfrentar o outro, mesmo que fosse apenas em minha fantasia.

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– Como podemos saber com certeza o que pensam as outras pessoas?.

O olhar do outro muitas vezes ganha proporções mitológicas, como se fosse a própria Medusa, transformada em monstro pela deusa Atenas. Diz a mitologia grega que Medusa possuía enormes serpentes na cabeça e asas de ouro. E que transformava em estátuas de pedra as pessoas que ousassem olhar diretamente em seus olhos.

Basta que a gente se preocupe com o olhar do outro, e imediatamente viramos estátuas de pedra, paralisados, amedrontados. O outro é a Medusa.

Mas precisamos nos lembrar que Medusa era uma górgona, irmã de Euríale e Esteno. Das três, Medusa era a única mortal. Sendo mortal, podemos vencê-la, como fez Perseu ao olhar para o horrendo monstro através do reflexo de seu escudo, decapitando-a com um único e certeiro golpe.

Usemos pois o escudo de nossa consciência para nos livrar desse olhar medonho que nos paralisa e nos transforma em estátuas de pedra. Façamos como Perseu, exterminando impiedosamente aquilo que limita nossos movimentos, rouba nossa espontaneidade e nos impede de ser quem de verdade somos.

Ah, quanto tempo precioso de nossas vidas perdemos dando à opinião alheia tanto poder. Quantas coisas deixamos de viver, quantas oportunidades perdemos.

O olhar do outro se torna como um gesso que limita nossos movimentos, rouba nossa fala, endurece nosso sorriso, rouba as asas de nossa alma.

Quando nos libertamos desse olho monstruoso que nos persegue, quando fazemos as pazes com nossa forma de ser, com nossas decisões, eliminamos muitas das causas de nossas angústias. Sentimos-nos leves para andar pela vida descalços, para rir de coisas bobas, para brincar como fazem as sábias crianças que não levam a vida tão a sério.

Passamos a agir com mais desenvoltura, com menos inibições, com mais firmeza e encantamento. Não existe nada mais libertador.

Ainda nos faz economizar uma boa quantia salvando nossos sapatos para que com eles sigamos pela vida, caminhando por nossos próprios pés!

Não permita que o olhar do outro paralise você

por Patricia Gebrim

A vida em suas cenas cotidianas tem sido a minha inspiração para esta coluna e o que escrevo hoje não foge à regra.

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Costumo almoçar em um pequeno restaurante que fica bem em frente ao meu consultório. Basta atravessar a rua e lá me aguardam as saladinhas de que tanto gosto. Assim, hoje, em meu intervalo para o almoço, cruzei a rua em direção a um prato saudável de salada acompanhado de um suculento grelhado. Sentei-me em uma pequena mesa na parte externa do restaurante, gosto de comer observando o movimento das pessoas na rua. Lá pelo meio do almoço, uma chuva espessa e assustadora despencou em meio a uma súbita ventania, fazendo os guardanapos voarem divertidamente para todos os lados. Terminei de almoçar sem pressa, esperando que a cortina de água se tornasse menos intensa, sem sucesso. Como chovia!

Percebi que o horário de meu próximo atendimento estava cada vez mais próximo e que eu inevitavelmente teria que atravessar toda aquela água para chegar ao consultório. Apesar de se tratar de apenas alguns metros, observei a rua cheia de água e olhei para os meus sapatos novinhos, bege claro, com dor no coração.

Após avaliar a situação, percebi que a água era limpa, não oferecendo risco à minha saúde. Apenas tirei os sapatos, para o assombro das pessoas que estavam no restaurante, e calmamente caminhei até o outro lado da rua, entrando no prédio com os sapatos nas mãos, sob o olhar divertido da recepcionista.

Foram apenas uns 30 metros, mas algo naquela travessia me fez um bem que mal consigo descrever. Cheguei do outro lado da rua com uma deliciosa sensação de leveza. Talvez por me lembrar de tempos de criança em que andar descalça sob a chuva era a coisa mais deliciosa do mundo. Talvez pela liberdade de salvar meus sapatos, sem me preocupar tanto com o que as pessoas pensariam de mim.

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Dei-me conta de que eu não seria capaz de fazer algo assim há alguns anos atrás. Com certeza teria estragado meus sapatos, com medo do julgamento das pessoas:

– Como assim, a “psicóloga” atravessando a rua descalça???

Há alguns anos atrás eu teria medo de enfrentar o outro, mesmo que fosse apenas em minha fantasia.

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– Como podemos saber com certeza o que pensam as outras pessoas?.

O olhar do outro muitas vezes ganha proporções mitológicas, como se fosse a própria Medusa, transformada em monstro pela deusa Atenas. Diz a mitologia grega que Medusa possuía enormes serpentes na cabeça e asas de ouro. E que transformava em estátuas de pedra as pessoas que ousassem olhar diretamente em seus olhos.

Basta que a gente se preocupe com o olhar do outro, e imediatamente viramos estátuas de pedra, paralisados, amedrontados. O outro é a Medusa.

Mas precisamos nos lembrar que Medusa era uma górgona, irmã de Euríale e Esteno. Das três, Medusa era a única mortal. Sendo mortal, podemos vencê-la, como fez Perseu ao olhar para o horrendo monstro através do reflexo de seu escudo, decapitando-a com um único e certeiro golpe.

Usemos pois o escudo de nossa consciência para nos livrar desse olhar medonho que nos paralisa e nos transforma em estátuas de pedra. Façamos como Perseu, exterminando impiedosamente aquilo que limita nossos movimentos, rouba nossa espontaneidade e nos impede de ser quem de verdade somos.

Ah, quanto tempo precioso de nossas vidas perdemos dando à opinião alheia tanto poder. Quantas coisas deixamos de viver, quantas oportunidades perdemos.

O olhar do outro se torna como um gesso que limita nossos movimentos, rouba nossa fala, endurece nosso sorriso, rouba as asas de nossa alma.

Quando nos libertamos desse olho monstruoso que nos persegue, quando fazemos as pazes com nossa forma de ser, com nossas decisões, eliminamos muitas das causas de nossas angústias. Sentimos-nos leves para andar pela vida descalços, para rir de coisas bobas, para brincar como fazem as sábias crianças que não levam a vida tão a sério.

Passamos a agir com mais desenvoltura, com menos inibições, com mais firmeza e encantamento. Não existe nada mais libertador.

Ainda nos faz economizar uma boa quantia salvando nossos sapatos para que com eles sigamos pela vida, caminhando por nossos próprios pés!