Lapso de pensamento leva a decisões perigosas

por Roberto Goldkorn

O pensamento abduzido

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“Se o Pensamento é abduzido, é furtado, mesmo por breves instantes, o primitivo ágil, velhaco e muitas vezes milenar, sobe rápido e senta-se no banco do piloto. Aí gente, nem adianta apertar os cintos”

Na semana que passou a mídia nos trouxe algumas manchetes policiais mais intrigantes que de costume. Uma mulher simulou um assalto à fotógrafa que fez o book de aniversário da filha. O namorado que pretendia fazer concurso para Policia Militar foi o “assaltante”. Depois do “assalto”, as duas foram prestar queixa na delegacia. Em poucos minutos o “assaltante” foi preso e a casa da mulher caiu. Vidas arruinadas.

Um rapaz foi preso por ter atropelado algumas pessoas num racha. Detalhe ele usava o carro da empresa em que trabalhava.

Uma mulher comunicou à polícia ter achado um recém-nascido num terreno perto de sua casa. Deu entrevista à TV dizendo-se revoltada pela atitude da mãe que teve a coragem de fazer isso. Pouco depois a polícia descobriu tudo: o bebe era filho dela. A denunciante era a mesma pessoa que fez a barbaridade de abandonar um recém-nascido. Ela está presa por falsa comunicação de crime e abandono de incapaz.

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O que esses episódios revelam? Pessoas comuns, sem histórico de banditismo, tomam decisões de longo alcance, buscando ora uma gratificação imediata ora livrar-se de um problema na maioria das vezes ilusório.

Essas pessoas tomam essas decisões num ambiente de vácuo de pensamento.

Mas isso é apenas a ponta do iceberg. Certamente essas ausências do pensamento geram diariamente milhares de vexames, constrangimentos e arrependimentos que vão durar por muito tempo. Podemos buscar razões sociológicas, psicológicas até culturais para explicar esses “crimes de vácuo”. Mas o fato é que cada vez mais pessoas se veem privadas de seu mecanismo pensante num determinado momento. Existe uma lei na magia que diz: não existe lugar vazio! Se permitirmos que o pensamento (raciocínio, valores, freios sociais, temor de punição) vaze por alguns instantes, forças abissais subirão à tona e ocuparão esse espaço.

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O primitivo que habita em nós, está sempre à espreita, esperando uma brecha para entrar em ação.

E quem é esse primitivo? É o pré-lei. O que busca satisfação imediata como os chimpanzés que engatam por trás em qualquer fêmea que esteja na posição certa. O primitivo não planta, ele é como o Carcará da célebre músíca interpretada por Maria Bethania que “pega para matar e come”.

O primitivo não foi treinado pelos estágios civilizatórios a pesar causas e consequências, o primitivo nem ao menos sabia que os bebês nasciam de relações sexuais. Os primitivos habitam ainda em cada um de nós, e têm lá a sua utilidade, mas não podem dirigir o nosso carro!

Para manter o primitivo em seu lugar, nas fossas abissais de nossa mente, precisamos exercer diariamente o direito de Pensar.

Pensar assim com P maiúsculo, é algo novo na história da Humanidade, deve ter qualquer coisa em torno de sete há dez mil anos. O primitivo tem por volta de 1 milhão de anos. Pensar, Pensar, Pensar. Entender que vivemos numa teia de aranha chamada sociedade, que tende a se distanciar desse milhão de anos, onde a lei da selva, das gratificações imediatistas imperava.

Se cada uma dessas pessoas não criminosas, parasse para pensar na cadeia (sem intenção de trocadilho) de acontecimentos que a sua atitude poderia gerar, não teria feito o que fez.

A mãe teria dito à filha: “Querida eu não tenho dinheiro para comprar o seu book com as fotos. Sinto muito”

O namorado quando consultado para fazer a empreitada, diria:

– Que que é isso companheira? Tá maluca? Se nos pegarem minha carreira na PM vai pro espaço… além do vexame, da cadeia, etc.

A mãe que abandonou o filho teria pensado: “Eu não posso criar esse filho. Vou comunicar à polícia, ou ao juizado que quero dá-lo para adoção”

O rapaz do racha se convidado teria dito:

– Pirou? Ir a um racha com o carro da empresa? Quer que eu perca o meu emprego?

Essas simples frases refletem a presença do Pensamento, que é fruto da consciência social, de que estamos todos presos a essa teia gigantesca onde tudo e todos se comunicam e cada gesto nosso causa algo na vida do outro, podendo gerar uma reação em cadeia.

Se o Pensamento é abduzido, é furtado, mesmo por breves instantes, o primitivo ágil, velhaco e muitas vezes milenar, sobe rápido e senta-se no banco do piloto. Aí gente, nem adianta apertar os cintos.