Filho internado várias vezes. O que fazer?

por Danilo Baltieri

Depoimento de uma leitora:

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"Agora são 1:56 da manhã e estou aqui em minha casa tentando achar uma fazenda terapêutica gratuita no RS para meu filho que há 12 anos usa droga. Ontem, levei ele ao CAPS e o psicólogo fez um cronograma para ele seguir. O que me deixa muito triste, é que sempre nas conversas ele concorda com tudo e sempre diz que vai fazer, que não quer mais usar. E, no outro dia, começa o inferno de novo. Já foi internado inúmeras vezes: clínicas, fazendas terapêuticas, voluntária e involuntária, gratuitas e particulares, e nada, nada resolve! Realmente, não suporto mais! Tanta mentira! Tenho lutado muito com meu filho e vejo que isso não vai acabar bem. Será que o senhor pode me dar uma ideia nova? Até Ibogaína já tomou. Não suporto mais ver meu filho assim!"

Resposta: Infelizmente, casos como este relatado não são incomuns na prática clínica diária. Os portadores de transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas são uma população bastante heterogênea, tanto em relação aos aspectos intrínsecos ao doente, quanto aos aspectos extrínsecos a ele.

A gravidade desses casos varia bastante e os clínicos especialistas devem estar aptos para identificar e manejar de acordo, sempre considerando os vários aspectos da doença.

Uma das características mais observáveis entre aqueles que padecem desses transtornos é o fenômeno da recaída. Isso se deve à natureza da doença, tendo em vista seus aspectos reforçadores para a manutenção do uso.

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O indivíduo dependente não apenas faz uso da substância para conseguir obter os efeitos imediatos dela; mas também, faz uso para impedir ou retardar os sintomas negativos relacionados à interrupção da droga.

Também infelizmente, os transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas afetam muitas pessoas ao redor do mundo. Por exemplo, fumar cigarros de nicotina parece afetar globalmente 1 entre 3 pessoas; a prevalência da dependência de bebidas alcoólicas tem sido registrada em cerca de 7 a 9% em vários países ocidentais. O Relatório Mundial sobre Drogas registrou em 2007 que o abuso de maconha ocorria entre 0,1 a 17,7% da população no mundo; outras drogas são abusadas por cerca de 0,1 a 3% da população global.

Apesar dos esforços de profissionais de várias áreas dedicados ao estudo e ao combate desse grave problema, estamos muito distantes de resolver todos os problemas relacionados a esse campo. A disponibilidade, bem como a demanda, são grandes.

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Dados os inúmeros sistemas cerebrais onde as substâncias psicoativas atuam e, consequentemente, os efeitos produzidos por elas, devemos sempre lembrar que as dependências químicas são uma doença do cérebro. E, como quaisquer outras doenças, do cérebro ou de outros órgãos, existem níveis de gravidade diferentes. Aliás, baseadas nos modelos neurobiológicos das atividades das substâncias psicoativas, propostas farmacológicas têm sido estudadas e, algumas vezes, implementadas após rigorosa aprovação quanto à eficácia e segurança. Certamente, não estou desconsiderando os vários outros aspectos psicossociais envolvidos com as dependências químicas, os quais transcendem os aspectos puramente biológicos e que requerem manejos específicos.

Boa solução: mudar de equipe especializada

Como regra geral, os tratamentos para os portadores devem ser sempre individualizados. À medida que as propostas primeiras não atingirem o sucesso desejado, outras deverão ser aventadas. Lembrando que o tratamento de uma doença requer equipe especializada que conheça as falhas pretéritas, que consiga estabelecer os diagnósticos acuradamente, que conheça profundamente o caso em questão, e que acompanhe o paciente nas fases da sua evolução terapêutica. Mudar de equipe especializada sempre quando o sucesso não for alcançado pode não ser uma boa opção.

Procedimentos para um tratamento bem-sucedido

a) o tratamento deve ser uma via de mão dupla. Isso significa que a equipe deve estar apta e disponível para propor auxílio especializado, e o portador deve estar plenamente interessado na sua recuperação e tentar seguir os passos propostos;

b) os portadores de dependências químicas estão mais em risco (cerca de duas vezes mais) do que a população geral de também apresentar outros transtornos mentais, como os transtornos depressivos e ansiosos. O retardo ou mesmo a falha no diagnóstico coexistente podem comprometer o prognóstico;

c) de acordo com o tipo de síndrome de dependência (por exemplo, de álcool, de opioides etc), o tratamento farmacológico específico deve ser aventado como importante ferramenta terapêutica;

d) os familiares devem estar inseridos na proposta de tratamento, de forma proativa.

Eleja uma equipe especializada composta por profissionais médicos E não médicos para seguir seu filho. Se você já tem essa equipe, converse com seus componentes a respeito de suas dúvidas e dificuldades.

Seguramente, os profissionais da equipe terão habilidades para tentar manejar tais dificuldades. Não demore.

Atenção!
Este texto e esta coluna não substituem uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracterizam como sendo um atendimento.